Invernáculo

Esta língua não é minha,
qualquer um percebe.
Quem sabe maldigo mentiras,
vai ver que só minto verdades.
Assim me falo, eu, mínima,
quem sabe, eu sinto, mal sabe.
Esta não é minha língua.
A língua que eu falo trava
uma canção longínqua,
a voz, além, nem palavra.
O dialeto que se usa
à margem esquerda da frase,
eis a fala que me lusa,
eu, meio, eu dentro, eu, quase.

(Paulo Leminski)

terça-feira, 28 de abril de 2015

Paixão

O problema é que eu preciso
Estar apaixonado
E você atende perfeitamente
A essa esdrúxula necessidade.

Você conta as mentiras que
Eu quero ouvir
Conta as histórias
Palavras cheias de mel...

Eu preciso romantizar...
Preciso pensar que neste
Exato momento
Você está neste avião
Que acaba de passar zunindo, cortando meu telhado...

Tenho que entrar no chuveiro
Sentir a água quente me abraçar
E pensar no teu calor...
Tenho que imaginar que neste
Exato momento
Você mergulha alguma banheira
Pensando em mim...
Abraçando algum travesseiro
Fuçando alguma página de internet, na solidão
Preenchendo o silêncio com alguma canção
De nós dois...

Eu preciso dessa paixonite pra viver
É a droga mais doce,
É o que não abro mão
E me custa o sorriso e os dentes.

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